06 maio 2020
COVID FORA DAS ALDEIAS

Mapa monitora aproximação de casos de coronavírus a terras indígenas em MT

Autor: Assessoria de Comunicação

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Populações indígenas inteiras foram dizimadas pelo contato com diversos vírus que desembarcaram com os europeus em terras brasileiras, há mais de 500 anos. Os efeitos avassaladores de doenças como gripe, varíola e sarampo estão na memória e relatos de anciões das aldeias indígenas, hoje os principais ameaçados por um novo vírus trazido de fora.

Como ação do plano emergencial de contenção à disseminação do novo coronavírus (COVID-19) em povos indígenas de Mato Grosso organizado pela Federação dos Povos e Organizações Indígenas de Mato Grosso (FEPOIMT), o Instituto Centro de Vida (ICV) elaborou e disponibilizou um mapa com atualização diária de número e localização de casos confirmados do vírus no estado.

A ferramenta mostra a proximidade de casos confirmados a aldeias indígenas do estado, o segundo com o maior número de Terras Indígenas (TIs) consideradas sob sério risco no país de acordo com pesquisa publicada pela Associação Brasileira de Estudos Populacionais (Abep).

Até a conclusão deste texto, Mato Grosso contabilizava 13 mortes entre os 366 casos confirmados, dos quais 29 pessoas se encontravam hospitalizadas e 215 recuperadas. Os casos estavam distribuídos entre 36 municípios do estado, que também contava com 1.029 notificações de Síndrome Respiratória Aguda (SRAG). Os dados são da Secretaria Estadual de Saúde (SES/MT).

O mapa do plano emergencial Covid Fora das Aldeias revela territórios das etnias kisêdjê, kayapó, nambikwara, xavante, bororo, tapirapé, paresi e cinta larga próximos a cidades com números que variam de um a 51 casos confirmados da doença.

Além das idas às cidades para compra de suprimentos e sacar benefícios como a aposentadoria e o bolsa-família, os indígenas sofrem maior risco de exposição ao vírus pelas invasões de garimpeiros e madeireiros ilegais que mantêm atividades nos territórios durante a pandemia.

Situação crítica

O estudo da Abep indicou 57 aldeias em Mato Grosso com índices de vulnerabilidade demográfica e infraestrutural classificados em moderado, alto, intenso ou crítico. A pesquisa considerou fatores como distância de centros com unidades de terapia intensiva (UTIs), saneamento, porcentagem de idosos na população e capacidade de manter distanciamento social.

Maior território indígena do país, o Parque Indígena do Xingu é considerado sob ameaça intensa e integra os municípios de Querência e Canarana, com dois casos confirmados cada, além de estar próximo a União do Sul, com um caso confirmado.

A pesquisa mostrou duas Terras Indígenas (TIs) do estado com vulnerabilidade crítica, classificação máxima do nível de risco.

Uma é a Enawenê-Nawê, que também conta com a maior média de moradores por domicílio (31 pessoas) dentre as terras indígenas do Brasil. A segunda é a aldeia da etnia chiquitano Portal do Encantado, que abrange dois municípios com casos confirmados, Vila Bela da Santíssima Trindade e Pontes e Lacerda.

As aldeias Jarudore, da etnia bororo, e Krenrehé, dos krenak e maxakali, figuraram na pesquisa como terceira e quarta, respectivamente, terras indígenas com maior índice de habitantes de 50 anos ou mais, principal grupo de risco do coronavírus.

Ainda não há casos confirmados do vírus em territórios indígenas do estado. Segundo dados do Boletim Epidemológico da Secretaria de Saúde Indígena (Sesai) do dia 3 de maio, há dois indígenas com suspeita de infecção notificados pelo Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI) Kayapó, que atende mais de 6 mil indígenas de municípios do norte de Mato Grosso e do sul do Pará.

Vulnerabilidade acentuada

De acordo com a FEPOIMT, a assistência de órgãos federais e estaduais são insuficientes para assegurar acesso à informação, alimentos, remédios e produtos de higiene, assim como equipamentos de proteção individuais às equipes dos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs).

A ameaça do novo coronavírus às cerca de 50 mil pessoas dos 43 povos indígenas do estado é potencializada pelas dificuldades de saneamento e acesso a água, atendimento médico e condições gerais de saúde nas aldeias.

Foto de grande casa de palha na aldeia yawalapitiOs xavantes, por exemplo, têm média quatro vezes superior à média nacional no número de diabéticos, grupo de risco da doença.

A federação informa que está em crescimento o número de ocorrências nas populações indígenas de doenças como hipertensão, diabetes, obesidade e doenças infecciosas como malária, tuberculose e hepatite B, assim como desnutrição e anemia em crianças.

“Tais comorbidades tornam essas pessoas mais vulneráveis a complicações, gerando preocupação sobre o modo como a epidemia poderá se comportar na população indígena, em termos de evolução e gravidade”, adverte comunicado da entidade.

Como parte do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena (SasiSUS), os DSEIs são responsáveis pela atenção básica à saúde, ações de saneamento e acompanhamento de pacientes com doenças crônicas nas aldeias. O serviço não inclui o tratamento de infectados pelo coronavírus, que devem ser encaminhados a centros especializados para testagem e encaminhamentos posteriores.

Diante da situação alarmante, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) enviou cartas aos governadores dos estados brasileiros demandando a elaboração de planos emergenciais para atendimento de pacientes graves que incluam a população indígena.

A entidade também criou a página Quarentena Indígena, definida como uma Comunidade para divulgação, articulação e mobilização de suporte aos povos indígenas

Aldeias e centros urbanos

Com habitações numerosas, a solução para conter o vírus entre os indígenas é manter controle de entrada e saída de pessoas com sintomas das aldeias, tarefa complexa principalmente em locais com trânsito intenso entre os municípios.

Já as áreas protegidas afastadas dos centros urbanos sofrem pela dificuldades na obtenção de informações. “Há aldeias distantes de difícil acesso onde as informações sobre a pandemia chegam atrasadas ou distorcidas”, afirma Soilo Urupe Chue, assessor da FEPOIMT.

Realizando articulações para conscientização acerca dos riscos do novo coronavírus entre povos das sete regionais do estado (Xingu, Kayapó, Noroeste, Cerrado Pantanal, Vale do Guaporé, Xavante e Araguaia), a federação contribuiu na construção do mapa e o utilizará para monitorar os casos e articular ações.

A organização indígena ressalta a necessidade de orientações e apoio que levem em consideração as necessidades específicas das aldeias indígenas.

“Cada povo tem suas próprias especificidades, suas crenças, costumes e tradições. Existem algumas onde o isolamento é mais fácil e outras onde é mais difícil”, explica.

O indígena do povo chiquitano também atenta à necessidade urgente de conter a disseminação por causa dos grupos de risco entre os povos (idosos e portadores de doenças crônicas), famílias em situação social mais vulnerável e populações de territórios não demarcados – grupos que Soilo classificou como ‘prioridade das prioridades’. “Somos todos vulneráveis, mas há aqueles que estão mais descobertos e exigem muita atenção”, diz.

O plano emergencial da entidade prevê diversas ações de enfrentamento à pandemia – entre elas, a arrecadação online para garantir o suprimento de produtos alimentícios e de higiene nas aldeias durante a pandemia. Você pode acessá-la aqui.

Para outras doações, é possível contatar a FEPOIMT pelo número (66) 98422-6792.

Indígenas e o coronavírus no Brasil

Dados da Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI) até o último domingo, 3 de maio, apontam 120 casos confirmados e seis óbitos pelo vírus entre indígenas no Brasil.

Entidades indigenistas, entretanto, consideram que existe uma subnotificação de casos pela falta de testes e porque a contagem do órgão não inclui indígenas não aldeados, ou seja, que moram nas cidades ou em outras áreas não demarcadas.

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